Para aqueles leitores que não estão familiarizados com a
“expulsão de demônios”, é uma mania religiosa que varre ostensivamente o mundo
há cerca de quinze anos. Durante a "expulsão de demônios", as pessoas
são inexplicavelmente levadas a comportamento histéricos, "falando em
línguas", comportando-se como animais selvagens, e muitas vezes caindo no
chão como se de repente tivessem algum tipo de ataque epiléptico. Como podemos
ver em diversas mídias que estão postadas no YouTube.
Esses fenômenos, podem ser classificados como histeria em
massa para a maioria dos observadores - cientistas e leigos – como deduziram.
Os estudos desses fenômenos têm sido registrados em centena de livros que
descrevem e discutem a histeria de massa. As conclusões têm demonstrado que
aqueles que participaram disso, foram emocionalmente envolvidos, são indivíduos
muito sugestionáveis e não há dúvida de que as expectativas criadas e o desejo
de desempenhar um papel importante na ocasião (isso é – ‘querer aparecer’),
também prevaleceram.
A crença de que os demônios existem e podem possuir as
pessoas é, naturalmente, material de ficção e filmes de terror, mas também é
uma das crenças religiosas mais amplamente difundidas no mundo. A maioria das
religiões afirma que os seres humanos podem ser possuídos por espíritos
demoníacos (a Bíblia, por exemplo, conta seis casos de Jesus expulsando
demônios) e oferece o exorcismo para combater esta ameaça. Então, na medida em
que as pessoas acreditam que os exorcismos "funcionam", devido ao
poder da sugestão e da psicossomática, eles poderão funcionar se a pessoa acreditar
que está possuída (e que um exorcismo irá curá-la), então ele poderá curá-lo.
Hollywood, é claro, tem capitalizado o fascínio do público
com o exorcismo e a possessão demoníaca, com filmes, muitas vezes. designados como
"baseados em uma história verdadeira". Existem inúmeros filmes
inspirados no exorcismo, incluindo "O Último Exorcismo” (The Last Exorcism),
"O Exorcismo de Emily Rose” (The Exorcism of Emily Rose), "Filha do
Mal” (The Devil Inside) e "O Ritual” (The Rite), variando em qualidade,
originalidade e significado. O maior sucesso, no entanto, é do clássico "O
Exorcista” (The Exorcist), nas semanas seguintes ao lançamento do filme em
1974, as igrejas católicas dos EUA receberam pedidos diários de exorcismos. O
roteiro foi escrito por William Peter Blatty, adaptado do seu best-seller de
1971, do mesmo nome. Blatty declarou que a inspiração do filme veio de um
artigo do Washington Post, que ele havia lido em 1949, sobre um menino de
Maryland que havia sido exorcizado. Blatty acreditou (ou alegou acreditar) que era
uma história verídica, embora pesquisas posteriores revelassem que a história
tinha sido sensacionalista e estava longe de ser credível.
Michael Cuneo, em seu livro “American Exorcism: Expelling
Demons in the Land of Plenty” (em português, Exorcismo Americano: Expulsando
Demônios na Terra da Abundância), credita a Blatty e ao filme "The
Exorcist", em grande parte, o interesse atual no exorcismo. Quanto à
precisão histórica, porém, Michael Cuneo diz que o filme de William Blatty é
uma enorme fantasia, fundamentada em uma história frágil do diário de um
sacerdote. Realmente houve um menino que passou por um exorcismo, mas
praticamente todos os detalhes sangrentos e sensacionais que aparecem no livro
e no filme foram exagerados e completamente inventados.
Na verdade, a partir do sucesso do filme, muitos passaram a
acreditar que os exorcismos são reais e relíquias da Idade das Trevas, e que
aqueles que sofrem o exorcismo são realmente possuídos por espíritos ou
demônios. A partir de então, exorcismos em abundancia estão sendo realizados, em
muitas igrejas neopentecostais ou de origem totalmente desconhecida, por
pessoas totalmente desqualificadas e algumas “mal-intencionadas”, muitas vezes
em pessoas que estão emocionalmente e mentalmente perturbadas, necessitando dos
cuidados de um profissional, ou em muitos casos são fraudes praticadas para
levar as pessoas a acreditarem no poder de falsos profetas ou charlatões, e
assim doarem dinheiro ou bens para eles.
Muitas pessoas gostam de filmes assustadores, mas a crença real
em demônios e da eficácia do exorcismo pode ter consequências mortais:
- Um garoto autista de oito anos morreu durante uma
cerimônia religiosa na igreja Templo da Fé, em Milwaukee, no Estado de
Wisconsin (EUA), realizada, segundo o pastor, para exorcizar os
"espíritos" responsáveis por sua condição (Folha Online, 25/08/2003).
- A freira Maricica Irina Cornici, morreu num ritual de
exorcismo levado a cabo por um padre e quatro freiras num convento cristão
ortodoxo. A jovem de 23 anos, viveu num orfanato e no claustro do monastério
Santa Trinidad, em Tanacu, (Romênia), onde ela passou seis dias sem água e sem
comida. Maricica foi exorcizada pelo padre Daniel Corogeanu, de 29 anos, e
quatro freiras, eles a prenderam com correntes a uma cruz de madeira. teve suas
mãos e pernas amarradas, e uma toalha foi colocada em sua boca. A morte de Maricica,
amordaçada e amarrada, foi causada por uma violência física muito grave.
Segundo o padre Corogeanu, Maricica estava possuída por demônios e maus
espíritos, era violenta, espumava e rejeitava a água benta e, por isso, teve
que ser imobilizada (Terra.com, 21 de junho de 2005).
- O adolescente franco-africano Kristy Bamu, de 14 anos, saiu
de Paris, acompanhado de quatro irmãs, e foi visitar sua irmã mais velha,
Magali Bamu, de 29 anos, e o namorado dela, Eric Bikubi, 28, em Londres. Magalie
junto com o parceiro, tentou exorcizar os espíritos malignos que teriam tomado Kristy
e suas duas irmãs. O trio foi forçado a cantar e orar sem parar durante dias,
sem direito a comida ou sono. Kristy passou a ser o foco do fervor religioso de
Eric, que passou a usar violência física, o menino foi agredido durante dias
com pedaços de pau, barras de metal, alicates e um martelo. Finalmente, Kristy
foi colocado numa banheira com as duas irmãs e a torneira aberta até
transbordar. Fragilizado pelas agressões, o adolescente afogou-se e morreu (Daily
Mail, mar 30, 2012).
- Jaqueline Sanchez de Belize, uma jovem de 22 anos, morreu por
não conseguir respirar, na Igreja Pentecostal de San Ignacio de Velasco, na
América Central, depois que sofreu uma parada cardiorrespiratória durante um
exorcismo para livrá-la de um "demônio" que estava dentro dela. Seus
pais acreditavam que ela tinha sido possuída por um demônio, pois vinha
sofrendo de convulsões, histeria e doenças que os médicos não conseguiam
diagnosticar, após ela ter jogado com uma tábua Ouija utilizada para realizar a
comunicação com espíritos. Testemunhas disseram que o corpo de Jaqueline foi
"levantado" no ar dentro da igreja enquanto falava com uma voz de
homem (O Popular, 30/11/2015).
- Uma "revelação divina" fez com que a
nicaraguense Vilma Trujillo, de 25 anos, fosse amarrada e queimada viva numa
fogueira para ser "curada" em uma suposta tentativa de exorcismo. A
Jovem foi levada para "uma oração de cura", no dia 15 de fevereiro, a
um templo da igreja evangélica Visão Celestial das Assembleias de Deus, em El
Cortezal, (Nicarágua), lá ela teve os pés e mãos amarrados e ficou sob a guarda
de Juan Gregorio Rocha, pastor da igreja. Dias depois, a diaconisa da igreja,
Esneyda del Socorro Orozco, ordenou que "por uma revelação divina, deveria
ser feita uma fogueira no pátio do templo para curar a vítima por meio do fogo”,
em 21 de fevereiro, depois da meia-noite, Trujillo foi queimada na fogueira (Por
BBC – Globo.com, 15/03/2017).
A ideia que os espíritos invasores são malignos é, em grande
parte, um conceito judaico-cristão. Muitas religiões e seitas aceitam que a
posse por entidades pode ser tanto benéfica quanto maléfica, e se ocorrem por
curtos espaços de tempo são fenômenos comuns - e não especialmente alarmantes -
da vida espiritual. O espiritismo, uma religião que floresce em toda a América desde
1800 e é praticado em muitos países hoje, ensina que a morte é uma ilusão e que
os espíritos podem comunicar-se com os humanos. Algumas correntes acreditam em
uma forma de possessão chamada canalização, na qual os espíritos dos mortos usar
o corpo de um médium e se comunicar através deles. Centenas de livros, esculturas,
telas e até algumas sinfonias, foram supostamente compostas por espíritos.
Claramente, estamos lidando com situações que não são
verdadeiramente espirituais na sua natureza, mas podem ser infelizmente compartilhadas
por crentes e não crentes. Obviamente, cabe-nos interpretar as emoções
associadas e encontrar o significado delas... ou não.
É possível que isto não seja nada mais do que o surto
hipnótico trabalhando em mentes sugestionáveis. A hipnose emprega o mesmo truque mental, seja
em uma palestra em um treinamento industrial ou nas artimanhas dos evangelistas
da TV. Podemos assistir em várias mídias na internet, um participante ou vários
voluntários, entrarem em colapso e caírem ao chão, começarem a gritar,
sacudir-se, dançar freneticamente, gritar ou falar palavras inteligíveis,
emitirem som como animais e outros comportamentos totalmente bizarros, que
parecem ser um estado de transe, esse(s) participante(s) algumas vezes estão
representando ou fingindo, o que torna muito questionáveis essas mídias.
A algum tempo, quando eu ainda fazia uma pesquisa
universitária sobre o tema, entrevistei uma senhora que havia participado de
uma dessas sessões de exorcismo, numa dessas igrejas questionáveis. Ela me
relatou ter sido convidada por uma vizinha que frequentava a igreja, depois de
vários convites, um dia ela resolveu acompanhar a vizinha, então ela relatou:
“sentei junto com a minha vizinha. Depois de várias músicas tocadas muito alto,
com as pessoas cantando aos gritos, o pastor começou a falar, primeiro em um
tom normal, depois começou a gritar, gritar, gritar, então as pessoas começaram
a gritar também, era um barulho infernal, minha vizinha ao meu lado, se sacodia
e me empurrava e cutucava, então, para meu horror minhas mãos estavam fazendo
coisas estranhas e eu rugia. Eu disse: ‘Oh Senhor por favor, por favor, não me
faça rugir, somente os animais rugem, as pessoas não rugem’, aí, não sei
porque, me levantei e eu girei bem alto e eu fiz um grande barulho, e eu estava
rastejando pelo chão, fazendo coisas terríveis e metade de mim estava pensando:
'Isso não pode ser eu', mas outra parte sabia que era".
Coisa terrivelmente perturbadora o testemunho dela!
Questionei o porquê do seu comportamento, ela respondeu: “o
pastor disse que eu tinha recebido o ‘Espírito Santo’, e agora eu tenho que
fazer o trabalho do Senhor”.
Por sua própria conta, ela foi invadida e possuída por uma força
que a reduziu ao comportamento bestial, rastejando e rugindo como um animal
selvagem, contra sua vontade consciente. Ela simplesmente foi controlada,
física e psicologicamente, por uma força de controle. E, no entanto, sua
experiência mesmo que dolorosa obviamente não era a presença do Espírito Santo
no seu Ser, não é assim que o Espírito Santo opera na vida de uma pessoa. Ele
não santifica pessoas possuindo-as como um demônio e forçando-as a fazer coisas
estranhas e sub-humanas. O espirito santo deve ser o elo de ligação de Deus com
o Homem, trazendo a verdade para suas mentes, iluminando sua compreensão.
Qualquer pessoa com algum discernimento espiritual sabe que essa força obscura
não era o Espírito Santo. Mas, considerando o viés da pesquisa, infelizmente eu
não pude dizer isso a ela.
Uma coisa importante para entender a histeria de massa, é
que ela pode arrastar até mesmo aqueles que estão em guarda contra ela. A
partir do relato, parece-me que é o que aconteceu, foi um caso clássico de
histeria de grupo, onde a vítima foi arrastada, através de uma série de
estímulos sensoriais a um comportamento incitado e compatível ao grupo.
É um comportamento comum, quando um grupo de pessoas está fugindo
de alguma coisa, outros, mesmo não sabendo o motivo, outras fugirem e correrem
com o resto do grupo, o mais rápido que puderem. As pessoas fogem, os corações
batem disparados, as pessoas morrem de medo, mesmo não tendo ideia do porquê. Quando
cessa a correria, as pessoas então querem saber do que estavam correndo, então alguém
pode disser, por exemplo, que um homem mostrava uma arma. Os sentimentos e as
emoções são absolutamente irresistíveis e ninguém deve sentir-se envergonhado
depois de, não por covardia, mas por segurança, assumir esse comportamento. Na
verdade, essa é uma reação muito normal nos nossos dias. Na realidade não
devemos estranhar nossa incapacidade total e repentina de manter nossa
individualidade, é natural instantaneamente, consciente ou contra a nossa
vontade, submergir ao comportamento do organismo maior, o grupo.
Tal aconteceu com minha entrevistada, ela foi jogada com
outras pessoas no chão e assumiu um comportamento bizarro, mesmo contra sua
vontade, neste caso, a conformidade social entrou no jogo. A conformidade
social é extremamente poderosa e às vezes é de controle total sobre o
comportamento. Eu sei que isso é verdade, não apenas por causa da experiência
descrita acima, mas porque já vi isso centenas de vezes na internet.
A conformidade social tem suas raízes na estratégia da
sobrevivência evolutiva. Os seres humanos têm que trabalhar juntos para
sobreviver e qualquer pessoa que "balança o barco" é considerada
"antissocial" e rapidamente condenada ao ostracismo pelo resto do
grupo. Não se comportar como se espera é uma grave inaptidão social.
Em um desse vídeos que estão no YouTube, podemos ver uma
moça que inicia uma dança girando e balançando os baços freneticamente, o que
acontece em seguida é várias outras mulheres agirem igualmente, e isso
aconteceu dentro de alguns segundos!
Então, mesmo que seja conhecedor da situação de antemão ou que
sua guarda esteja alta, quando chegar o momento, para a maioria, é irresistível
não seguir o comportamento do grupo. A perda do autocontrole e da autodeterminação
ocorre em um nível inconsciente, mesmo que a pessoa ainda esteja consciente.
Você já se pegou balançando no ritmo das fortes batidas da
bateria de uma Escola de Samba? É, quando você vê, está sambando, mesmo sem
saber! Portanto, mesmo que conscientes, não estamos totalmente conscientes das
mudanças que acontecem em nosso próprio cérebro, e aí vai um longo caminho para
explicar o complexo mecanismo de resposta comportamental das pessoas aos
estímulos externos.
Agora me recordei de um documentário sobre o bocejar, quando
alguém boceja próximo a você, é difícil também não bocejar. Você pode até tentar
parar, mesmo assim continua bocejando. Quanto mais você pensa em tentar não
bocejar, mais difícil torna-se não bocejar.
Não é desconhecido também que certos pregadores carismáticos
usam truques nestas circunstâncias. Um leve choque elétrico é suficiente para
convencer, até mesmo um cético endurecido, de que algo incomum realmente
aconteceu. Às vezes, o aparelho que descarrega essa energia elétrica está
escondido em uma cruz de madeira decorada ou nas mãos. Os olhos dos
espectadores seguem a mão que toca a cabeça, sem saber que o pregador está descarregando
o choque elétrico não com a mão que toca a cabeça, mas, com a outra que toca
outra parte do corpo mais baixo. Para o destinatário, a sensação é tão rápida
que é indistinguível.
Fico surpreso com a facilidade com que algumas pessoas são
enganadas, e muito agastado com aqueles que usam a religião como uma ferramenta
para usando a espiritualidade enganar os crédulos para seus próprios objetivos obscuros
e nefastos.
Eduardo G. Souza
Nenhum comentário:
Postar um comentário