Os tanques soviéticos invadem Budapeste e Praga. Os bancos
russos criam contas secretas e empresas de estatais sombrias, invisivelmente
compram influência e engolem ativos estratégicos em toda a Europa.
Colaboradores no Oriente e outros acólitos levam ao Ocidente
o pensamento leninista.
Lobbies empresariais e industriais introduzem nas
negociações e divulgam de leste a oeste, o sucesso soviético.
Uma rede de partidos comunistas e grupos de esquerda propalam
o sucesso do comunismo e cuidam dos interesses de Moscou.
Uma rede de corporações obscuras, negócios com energia e
complexos esquemas de lavagem de dinheiro atraem as elites estrangeiras e
formam um lobby poderoso no Kremlin.
Isso foi o passado, conheça o presente.
De muitas formas, a corrupção russa é o novo comunismo
soviético. O dinheiro sujo do Kremlin é a nova ameaça vermelha.
No Oriente, a aliança de estados satélites, com economias sob
o comando socialista no estilo soviético e os sistemas políticos autoritários,
foi substituída por um aglomerado de cleptocracias, com características econômicas
do capitalismo russo e governança disfuncional.
E as tentativas da União Soviética de subverter o Ocidente pelo
poder do pensamento marxista-leninista, deram lugar à Rússia de Vladimir Putin
buscando corrompê-lo com a isca do dinheiro fácil.
Quanto mais as coisas mudam, mais elas ficam iguais.
"O Kremlin não precisa ser o líder absoluto de um bloco
de nações e do Pacto de Varsóvia, mas pode exacerbar as divisões existentes,
subverter as instituições internacionais e ajudar a criar um mundo onde sua forma
de autoritarismo corrupto floresça", Peter Pomerantsev(1) e Michael Weiss(2)
escreveram em um artigo amplamente divulgado.
Hoje a ameaça real do Kremlin usa as armas da informação, da
cultura e do dinheiro.
A União Soviética procurou espalhar o comunismo e
estabelecer um bloco de nações leais a Moscou. A Rússia de Vladimir Putin
procura espalhar seu modelo de negócios corruptos para estabelecer um bloco de
nações dependentes do Kremlin.
A União Soviética estava principalmente preocupada com o seu
quintal próximo, a Europa Oriental, mas também procurou espalhar seu modelo
socialista pelo mundo. A Rússia de Putin também está se concentrando em seu quintal,
a ex-URSS, mas também está empurrando a cleptocracia pelo mundo.
Hoje utiliza empresas de energia com estruturas de
propriedade obscuras como as empresas RosUkrEnergo(3), Eural TransGas Kft(4) e MoldovaGaz
JSC(5) para fisgar e controlar elites em estados anteriormente soviéticos, como
Ucrânia, Bielorrússia e Moldávia.
Mais e o futuro... O Kremlin está criando empresas de mineração
e outras atividades com a estrutura da Vemex(6), uma empresa de comércio de
energia com uma estrutura de poder e uma organização indecifrável, que
possibilitou que a Gazprom, controlar entre 10 a 12% do mercado de energia
checa.
O Kremlin realmente dominou a arte de fazer acordos corruptos
para criar relações cliente-cliente além das fronteiras russas.
"A Gazprom, com o apoio silencioso do Kremlin, criou
cerca de 50 empresas intermediárias, soturnamente ligadas à Gazprom e
espalhadas por toda a Europa", disse o analista Roman Kupchinsky(7),
ex-diretor do Serviço Ucraniano da Radio Free Europe/Radio Liberty, em
testemunho perante o Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA em junho
de 2008.
Kupchinsky citou também o grupo Centrex, com sede em Viena,
de propriedade de uma empresa Holding de Chipre e da RN Privatstiftung na
Áustria, bem como da rede Gazprom Germânica. Tais empresas, acrescentou,
"não agregam nenhum valor ao preço do gás russo vendido nos mercados
europeus, mas eles ganham enormes somas de dinheiro que parece simplesmente
desaparecer através de empresas em Chipre e no Liechtenstein". Kupchinsky
também disse ao comitê que "na Hungria, as empresas de fachada com
suspeitas de vínculos com o crime organizado e a Gazprom procuram controlar
grandes segmentos da distribuição doméstica de gás e da geração de
energia".
Há também provas de que Putin recrutou alguns membros da
antiga rede de inteligência “Stasi” (a temida polícia política do regime
comunista alemão) do leste da Alemanha, para criar empresas de fachada em toda
a Europa.
Um artigo investigativo de setembro de 2007 do jornalista
alemão Hans-Martin Tillack(8) descobriu que a Gazprom Germânia era "uma organização
de ex-membros dos serviços de segurança do leste da Alemanha".
"Esta é a história de uma invasão. Uma empreitada
maciça, planejada com bastante antecedência. O Estado-Maior está localizado
muito distante no Leste, em Moscou, a capital da Rússia. A área-alvo é a
Alemanha e o resto da Europa Ocidental". Escreveu Tillack.
"A história desta invasão está repleta de ex-oficiais
da Stasi e outras figuras sombrias. É uma história de empresas de fachada, que não
possuem uma sede física, e nem sequer têm uma caixa postal, são empresas que só
existem nos papeis aninhadas dentro de outras empresas. A impressão primordial
é que eles estão escondendo o fluxo de fundos e capitais."
Mas é uma invasão que muitas elites no Ocidente estão
querendo ou, inconscientes, participando.
"A conquista da corrupção russa, com fundos ilícitos
regularmente lavados em todo o Ocidente, trabalha para o domínio do Kremlin
tanto nacional como internacionalmente", escreveu Pomerantsev e Weiss.
"Se a premissa da ideia neoliberal da globalização é
que o dinheiro é politicamente neutro, a ausência essa interdependência será um
impulso para a aproximação, e o comércio internacional sublimará a violência em
harmonia, a visão russa permanece na visão mercantilista, com dinheiro e
comércio sendo usados como armas e interdependência a um mecanismo da
agressão".
O comunismo, apesar de suas falhas, tentou atrair ideais e
aspirações humanas universais. Mas na prática, agiu contra a natureza humana.
A corrupção apela ao instinto humano mais universal e mais
básico – ‘a ganância’. E, infelizmente, muitas vezes está em sincronia com a
natureza humana - o que torna a nova forma de dominação potencialmente mais
perigosa e insidiosa do que a antiga.
A corrupção não é apenas uma questão moral, ética, política,
policial e jurídica. Agora é um problema de segurança nacional e precisa ser
tratada como tal.
Em nosso país, apesar da pouca ação direta da corrupção
russa, não podemos negar, que os antigos comunistas, que tentaram impor o
regime comunista pela força das armas, e foram derrotados pelas forças armadas,
hoje são a principal força da corrupção que assola o país.
O exemplo da ação comunista na demolição social, através dos
costumes, da cultura e da política está sendo aplicado sem sombra de dúvidas em
nossa sociedade.
É verdade que grande parte dos corruptos está usando a
corrupção como forma de enriquecimento ilícito, mas, por trás, dessa rede de
corrupção em benefício próprio, podemos sentir oculta uma ação de destruição
dos princípios que sustentam uma nação. E quando o povo, não suportar mais o ‘status
quo’, qualquer possibilidade de mudança, de pôr um fim no caos, será aceita,
mesmo que seja a implantação de um regime comunista de exceção!
Eduardo G. Souza
(1) Peter
Pomerantsev nasceu em 1977, em Kiev, na Ucrânia. Em 1978 mudou-se com seus pais
para a Alemanha Ocidental, depois que seu pai, o radialista e poeta Igor
Pomerantsev foi preso pela KGB, acusado de divulgar literatura antissoviética.
Mais tarde, foi para Munique e depois Londres, onde seu pai, Igor Pomerantsev,
trabalhou para o BBC World Service. A mãe de Pomerantsev, Liana Pomerantsev, é
cineasta e seu documentário “Gulag”, ganhou o prêmio Grierson Award, do Best
British Documentary. Pomerantsev frequentou a Westminster School, em Londres, a
European School e estudou literatura inglesa e alemão na Universidade de
Edimburgo. Ele participou dos Cursos Superiores para escritores de roteiros e
diretores de filmes em Moscou. Após a universidade, ele se mudou para a Rússia
em 2001. Pomerantsev viveu entre 2001 e 2010 em Moscou trabalhando na TV, em
programas transmitidos no canal de entretenimento russo TNT. Em 2014, no seu artigo:
"Inside the Kremlin's Hall of Mirrors” (leia em: https://www.theguardian.com/news/2015/apr/09/kremlin-hall-of-mirrors-military-information-psychology), Pomerantsev explorou como a guerra de
informações mudou no século XXI. Ele também contribuiu no estudo “tink tanks” sobre
guerra da propaganda e desinformação, e editou uma série de estudos sobre o
assunto, incluindo assuntos que vão desde o uso das mídias sociais até a
literacia midiática.
(2) Michael
Weiss é um jornalista e escritor americano, nascido na cidade de Nova York, formou-se
bacharel em História, em 2002, no Dartmouth College, uma Universidade de
pesquisa na cidade de Hanover, New Hampshire. Weiss é editor-chefe da revista
on-line “Interpreter”, que traduz e analisa notícias russas, editor sênior do “The
Daily Beast” e colunista regular da revista “Foreign Policy”. Em 2015, ele
co-escreveu o livro: “Inside the Army of Terror with Hassan Hassan” (Dentro do
Exército do Terror com Hassan Hassan). Em novembro de 2014, Weiss publicou um artigo
em sua revista on-line, onde ele acusou a Rússia de realizar campanhas de
"propaganda e desinformação". O artigo de Weiss incluiu recomendações
sobre como enfrentar a propaganda russa, que inclui a criação de um sistema internacional
para a desinformação.
(3) A
RosUkrEnergo é uma empresa registrada na Suíça que transporta gás natural do
Turquemenistão para países do leste europeu. 50% da empresa é detida pela
Gazprom, através da sua subsidiária Rosgas Holding AG, registrada na Suíça, e
outros 50% pela empresa privada Centragas Holding AG, registada na Suíça, em
nome de um consórcio do Grupo GDF, de propriedade de Dmytro Firtash e Ivan
Fursin. A empresa foi criada em julho de 2004 em um acordo do então presidente
ucraniano, Leonid Kuchma, com o russo Vladimir Putin para substituir Eural
Trans Gas. Em abril de 2006, o monitor de corrupção da Global Witness, com sede
em Londres, publicou um relatório focado na RosUkrEnergo e outras empresas que
agiram como intermediárias entre o Turquemenistão, a Rússia e a Ucrânia. O
relatório destacou muitas ligações entre a RosUkrEnergo e a anterior Eural
Trans Gas. Segundo o relatório, o advogado israelense Zeev Gordon havia
registrado a Eural Trans Gas em nome do empresário ucraniano Dmytro Firtash.
Também no final de abril de 2006, o Izvestia informou que o principal acionista
da RosUkrEnergo é Dmytro Firtash. O relatório afirmou que ele detinha 90% da
CentraGas Holding, equivalente a 45% da RosUkrEnergo. O relatório afirmou que
um outro proprietário é outro empresário ucraniano Ivan
Fursin, o principal acionista da Odessa Film Studio e um dos donos do
Misto-bank.
(4) A empresa
Eural TransGas Kft. (ETG) é sucessora da Itera que transportava o gás turcomano
para a Ucrânia. Segundo o jornal "Capital de Negócios”, a ETG foi
registrada na aldeia húngara de Chabda. Ela foi fundada por quatro indivíduos:
o israelense Averbukh Gordon e três cidadãos da Roménia Ancha Negreanu, Luz
Lucas e Savvu Mihay, todos os quatro estão desempregados. Em 2003, a ETG
tornou-se a única transportadora do gás turcomano para a Ucrânia. Como resultado,
esta empresa com um pequeno capital declarado tem acesso a suprimentos de
combustível de bilhões de dólares. Os motivos desse crescimento bem-sucedido da
ETG, aparentemente, estão no alto grau de influência de seus clientes. Vários
meios de comunicação sugeriram repetidamente a conexão da ETG com o conhecido
empresário Semyon Mogilevich.
(5) A
empresa MoldovaGaz JSC é uma das maiores empresas do setor de energia da
República da Moldávia. As atividades da empresa e das empresas subsidiárias
concentra-se no transporte, fornecimento e distribuição de gás natural na
República da Moldávia, bem como o transporte de gás natural para os
consumidores dos Balcãs. A MoldovaGaz" está em uma situação crítica devido
às dívidas acumuladas desde agosto de 2013, quando a entrada de dinheiro dos
operadores do complexo de energia térmica (CTE) subitamente caiu em função da queda
do consumo de gás natural. Como solução a empresa poderia entregar parte das
ações da "MoldovaGaz", para a empresa russa “Gazprom” credora da
maior parte da dívida. Assim, as redes de gás construídas a partir do dinheiro
dos cidadãos da Moldávia passariam a pertencer a empresa russa, isso levará à
subjugação energética da República da Moldávia a Moscou.
(6) A
Vemex é uma suposta empresa checa que vende gás natural russo. Desde que surgiu
em 2001, aparentemente do nada, capturou cerca de 10% do mercado checo de gás
no varejo. A sua estrutura de propriedade é essencialmente indecifrável, ela é
propriedade de um grupo de empresas com sede na Suíça, Alemanha e Áustria, uma
das quais é Centrex Europe Energy & Gas, fundada pelo braço de
financiamento da Gazprom e registrada na Áustria e, segundo a Comissão
Europeia, de propriedade de duas empresas, uma registrada em Chipre e outra
controlada pela subsidiária alemã da Gazprom. Entre esses tipos de entidades
sombrias e contratos importantes com empresas como Gazprom e Lukoil, a
República Checa entrega a Rússia quase 80% de seu gás natural. "Muitas
empresas russas estão sob a influência do estado, especialmente no setor de
energia", disse Karel Schwarzenberg, um político checo de Habsburgo, em
uma entrevista no início deste ano. (Desde então, Schwarzenberg tornou-se o
ministro das Relações Exteriores.) "E a Rússia está se tornando cada vez
mais um estado autoritário. Existe sempre o perigo de que a influência
econômica se transforme em influência política".
(7) Roman
Kupchinsky nasceu em Viena, na Áustria e imigrou para os Estados Unidos em
1949. Graduou-se em Ciências Políticas pela Universidade de Long Island. De
1978 a 1988 foi presidente da Prolog Research Corp., uma editora de língua
ucraniana e empresa de pesquisa. De 1990 a 2002 foi diretor do serviço
ucraniano da Radio Free Europe/Radio Liberty. De
2002 a 2008 foi analista sênior da RFE/RL. Ele foi o autor de numerosos artigos
sobre assuntos ucranianos, energia russa e política internacional. Ele editou o
“Crime Organizado” da RFE e o “Relógio de Corrupção”, bem como duas coleções de
artigos "O Problema da Nacionalidade na URSS" e " Pogrom in
Ukraine". Ele faleceu em janeiro de 2010, em Arlington, na Virgínia.
(8) Hans-Martin
Tillack é um repórter alemão. Nasceu em 1961, em Königs Wusterhausen. Estudou
ciências políticas e sociologia em Marburg e em Berlim. Em 2005, ele recebeu o
Leipziger Medienpreis, pela reportagem publicada na revista alemã Stern, que
expor o escândalo do Eurostat, o órgão estatístico da UE baseado no Luxemburgo.
Suas revelações sobre contas ocultas e contratos fictícios, levaram, em 16 de
maio de 2003, ao Financial Times publicar várias manchetes que revelaram
"Uma vasta rede de saque de fundos comunitários". Dois altos gerentes
franceses foram removidos do cargo e toda a diretoria do Eurostat foi demitida.
Seis investigações de fraude separadas no Eurostat foram exigidas pelo OLAF, o
órgão anti-fraude da UE. Posteriormente, Hans-Martin Tillack foi preso pela
polícia belga por determinação das autoridades da União Europeia, cujos órgãos
ele estava investigando em relação a alegações de fraude. O OLAF acusou o
repórter de ter subornado funcionários da UE para obter documentos para o
artigo publicado em 2002 sobre alegadas irregularidades no OLAF. O jornalista
foi detido, sua casa e escritório foram revirados, e 16 caixas de documentos,
duas caixas de arquivo, dois computadores e quatro telefones celulares foram
apreendidos. Em 2007, o Tribunal Europeu julgou que o direito de Hans-Martin
Tillack de não revelar as suas fontes de informação tinha sido violado e sentenciou
à Bélgica pagar 10 mil euros por danos morais e 30 mil euros em custas. Os
documentos apreendidos foram devolvidos a ele em 2008. Em janeiro de 2009, o
órgão judiciário belga encerrou definitivamente o caso interposto pelo órgão de
luta contra a fraude da UE, o OLAF, contra Hans-Martin Tillack.
Bibliografia:
Goldman,
Marshall. “Petrostate: Putin, Power, and the New Russia”. Oxford University
Press, 2008.
Holmes,
Leslie. “Rotten States? Corruption, Post-Communism, and Neoliberalism”. Duke
University Press, 2006.
Kupchinsky,
Roman. “The Merger Between Crime and Terrorism”. Corruption Watch: September
19, 2002. Publicado em Radio Free Europe/Radio Liberty, site:
https://www.rferl.org/a/1342425.html
Kupchinsky,
Roman. “Walking A Fine Line: The Media and Terrorism”. Corruption Watch:
October 9, 2003. Publicado em Radio Free Europe/Radio Liberty, site:
ttps://www.rferl.org/a/1342385.html Ostrovsky, Arkady. “The Invention of
Russia: The Rise of Putin and the Age of Fake News”. Penguin Books, 2017.
Pomerantsev,
Peter. “Nothing Is True and Everything Is Possible: The Surreal Heart of the
New Russia”. Guardian First Book Award, Faber & Faber, 2015.
Ther,
Philipp and Siljak, Ana. “Redrawing Nations: Ethnic Cleansing in East-Central
Europe, 1944–1948”. Rowman & Littlefield, 2001.
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